QUINZENA CULTURAL 2018 – O DIREITO À MEMÓRIA

25 de Junho a 6 de Julho de 2018

Após a tão bem acolhida quinzena cultural de 2017, “Os livros precisam de nós”, propomos, este ano, o lema “O direito à memória”. Caminhando a passos largos para a celebração do 30º aniversário, a UATIP, só por si, já possui um património de recordações que tem sido, entre nós, devidamente honrado. Em 2018 desejamos, no entanto, abordar a “arte da memória” num sentido mais amplo.

A quinzena cultural irá acolher intervenções científicas, culturais e artísticas organizadas em cinco núcleos, simultaneamente independentes e articulados, que passamos a apresentar:

1 – A Luta da Memória contra o esquecimento “A luta da memória contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento”. Milan Kundera

Começamos por identificar aquilo que de significativo, no interior da nossa comunidade, andamos a esquecer: os livros da biblioteca que estão à espera que alguém os desperte, os cuidados ecológicos na forma como funcionamos, os associados (os amigos) que temporária ou definitivamente deixam de poder frequentar as aulas, os saberes individuais que estão por partilhar, os vizinhos que não fomos conhecer. A quinzena cultural propõe-se lançar frentes de combate contra tais “esquecimentos”.

2 – Modernos e sem memória  “Nós, modernos, não temos memória” F. Yates

A perda dos elos entre passado e presente, isto é da capacidade de lembrar, aparece na arte e nas ciências sociais como uma ameaça do mundo moderno. A memória surge como contraponto à submissão do homem à mecanização e à perda de sentido. Arendt denunciou não apenas a perda da memória mas a perda da consciência da perda da memória: indivíduos modernos esqueceriam que se esquecem e seriam felizes no seu esquecimento, embora a felicidade alcançada estivesse sempre limitada pelo facto de serem eles próprios constituídos por desejos, anseios e comportamentos alheios à sua vontade. A memória seria, assim, a condição de inserção dos indivíduos no espaço e no tempo, a forma de experiência que torna possível a acção individual responsável, ou seja, aquela que tem por finalidade o bem comum.

3 – O filtro de uma felicidade esquecida.  “A tragédia (…)começou (…) quando desapareceram mentes para herdar e questionar, pensar e lembrar”  H. Arendt

A nossa civilização tem sido perita em desenraizar. Desenraizamos povos de outros continentes, desenraizamo-nos a nós mesmos. Há décadas atrás, Albert Jacquard comentava que as novas gerações vinham ao mundo como se tivessem acabado de chegar de outro planeta. Actualmente, as “voracidades” a que somos sujeitos e o triunfo do imediatismo faz com que cada novo passo de um ocidental represente, quase sempre, um desenraizamento. Receptivos a uma informação sempre nova, sempre constante e quase sempre medíocre, vamos esquecendo aquilo que fomos, as pessoas que nos formaram, as canções que nos arrebataram, as subtilezas da nossa língua, a nossa identidade. A memória é (queremos acreditar!) o filtro que nos pode devolver a unidade e, quem sabe, uma felicidade esquecida.

4 – Os perigos da Memória: Velar o corpo que já não existe “Eu nunca soube como contar uma história. (…) Por que não recebi este dom?”  Derrida

Jacques Derrida questionou a possibilidade de contarmos histórias com as nossas memórias e a possibilidade de expressarmos no presente experiências adquiridas no passado. Compara a memória ao pranto e à dor daquele que vela o corpo que já não existe. Este será um dos seus perigos. De igual modo, a memória pode ser um instrumento de dominação e opressão tão eficaz como o esquecimento. Por sua vez, tentativas de recuperar situações traumáticas como as do Holocausto, incapazes de traduzir a dimensão exacta do acontecimento, não têm o efeito perverso de banalizar o horror?

5 – O amanhã: digerir, assimilar e recriar os tesouros do passado  “A oposição entre o futuro e o passado é absurda. O futuro não nos dá nada, somos nós que, para o construir, temos de lhe dar tudo, dar-lhe até a nossa própria vida. Mas para dar é preciso possuir, e não temos outra vida, outra seiva, a não ser os tesouros herdados do passado e digeridos, assimilados que recriamos. De todas as necessidades da alma humana nada há mais vital do que o passado”. Simone Weil

É com a matéria do passado, naturalmente sujeita a questionamento e análise, que nos propomos combater pelo amanhã. Num mundo que por vezes parece ser gerido sem regras, que utopias estão a ser preparadas na defesa de um futuro com lugar para o pensamento, a cultura, a paz e a dignidade?

PROGRAMA COMPLETO EM PDF (para imprimir).

Deixar um comentário